Principal grupo de risco da covid-19, idosos têm demandas que vão desde melhor acesso à saúde preventiva e moradia mais humanizada até o reconhecimento de profissionais relacionados ao seu bem-estar, como os cuidadores
O mundo tem mais de 900 milhões de idosos. Em 2050, a previsão é de que o número de pessoas acima dos 60 anos chegue a 2 bilhões, o que corresponderá a 20% da população do planeta. Os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) evidenciam a necessidade de encarar os desafios da longevidade, que ficou, ainda, mais urgente com a pandemia do novo coronavírus. ;Uma transformação demográfica dessa magnitude requer muitas transformações sociais, políticas e culturais;, alerta Rosita Kornfeld Matte, professora de gerontologia da PUC de Santiago, no Chile.
O impacto da covid-19 nas pessoas idosas;, publicado em maio pela Organização das Nações Unidas (ONU), mostra que 80% dos mortos pelo novo coronavírus na China foram pessoas com 60 anos ou mais; na Itália, 83%. Até 16 de junho, segundo o Ministério da Saúde, 72,9% dos mortos no país são idosos.
Grupo de risco da doença, os mais velhos não precisam de atenção apenas em uma situação de crise sanitária. As demandas passam por acesso à saúde preventiva, garantia de direitos, lugares mais humanizados e políticas públicas que entendam as reais necessidades da faixa etária.
Entre as mudanças necessárias, a presidente e fundadora da Fundação Pilares da Espanha, Pilar Rodríguez, também gerontologista e especialista em serviços sociais, chama a atenção para os locais que acolhem essa população. ;Nas pesquisas que fazemos, os idosos dizem que não querem morar em locais de acolhimento com aparência de hospitais. Eles preferem locais de tamanho pequeno, próximos a centros comunitários e que sejam, o mais parecido possível, com uma casa possível;, descreve.
Hoje, há uma série de modelos que atendem aos anseios dos mais velhos, como apartamentos comunitários, residências compartilhadas entre os próprios idosos e residências colaborativas. No sentido contrário, investem-se recursos de maneira mais notória em alojamentos, que estão entre o que menos desejam as pessoas idosas, segundo Pilar. ;O maior investimento deveria ser em atenção domiciliar, programas de apoio às famílias, programas comunitários, intervenções e planos de habitação, para que muitas dessas pessoas possam permanecer nas suas casas;, recomenda.
A tarefa passa pela valorização de uma profissão pouco reconhecida, mas extremamente utilizada: a dos cuidadores.
;Essa é uma lacuna muito grande no cenário nacional. Não temos uma política que inclua o cuidador do idoso;, critica a doutora em saúde pública e especialista em gerontologia. Vale ressaltar que essa é uma atividade com perfil muito bem-definido. ;No Brasil, o cenário de cuidadores de idosos é composto por mulheres pobres, sem escolaridade, sem direitos formais;, descreve Berzins. Durante a pandemia, essas cuidadoras continuaram trabalhando, mesmo com alto grau de vulnerabilidade à transmissão do vírus.
Para Rosita Kornfeld Matte, que foi relatora das Nações Unidas para Direitos das Pessoas Idosas por seis anos, avanços significativos no assunto velhice começam pelos direitos humanos. ;Primeiro tem de se atentar à heterogeneidade do envelhecimento, o que jamais se olhou;, argumenta. O segundo ponto é entender que o assunto abarca todo o conjunto de direitos humanos: econômicos, sociais, culturais, sanitários e, também, os direitos civis e políticos. ;O enfoque assistencialista deve mudar muito fortemente para um enfoque de direitos;, ressalta Matte.
A professora defende a criação de um instrumento jurídico internacional para que a promoção dos direitos e da integridade das pessoas idosas tenham consequências práticas. ;Esse instrumento tem importância especial para as pessoas idosas em situação de emergência, de vulnerabilidade;, acrescenta.
Fonte: https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/brasil/2020/08/02/interna-brasil,877661/pandemia-expoe-os-desafios-da-longevidade.shtml